Arrendamento urbano. Propostas para dinamizar o mercado.

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A necessidade de habitação arrendada é um desiderato que não está suficientemente alcançado, principalmente devido às orientações e práticas seguidas pelos governos e municípios que não atentaram adequadamente nas necessárias respostas de natureza política, económica e fiscal.

De facto, pretendendo deixar ao chamado mercado a resposta essencial às necessidades das famílias, a verdade é que não se conseguiu atingir um nível de oferta em quantidade, em qualidade e em preço que satisfizesse a procura.

Importa referir que o mercado de arrendamento sempre apresentou enorme carência, tanto na quantidade, como na qualidade da oferta e sempre se praticaram preços demasiado elevados para a disponibilidade das famílias. Tal como se verifica no presente!

Sendo o arrendamento uma solução lógica e natural para satisfazer a necessidade de habitação, os governos e os municípios ignoraram sistematicamente a adoção de medidas específicas e apropriadas para a real existência de um mercado de arrendamento saudável e dinâmico, que garanta oferta diversificada e rendas com valores compatíveis com os rendimentos das famílias, em geral, e em particular para os mais jovens.

Ao contrário, os governos legislaram na redução de direitos dos arrendatários, contribuindo para o desincentivo no arrendamento, não tomando as medidas administrativas e fiscais para o dinamizar.

Na verdade, no que respeita à habitação, a política seguida com inegável expressão e expansão a partir dos anos 80, até à primeira década deste século, foi essencialmente centrada na aquisição, apoiando-a através de facilidades no crédito, de incentivos fiscais diversos, desde a isenção de impostos e taxas à bonificação e redução de juros, com o consequente e excessivo endividamento das famílias, dos bancos e do Estado, política e medidas que contribuíram, sem margem para qualquer dúvida, entre outras consequências, para reduzir o arrendamento habitacional a uma espécie de subproduto económico e a um anacronismo cultural.

Não estando, ou colocando, em questão a satisfação da habitação através da aquisição, o seu excesso originou que, de acordo com o Censos de 2011, 75% das famílias em Portugal tenha habitação própria, o que se afigura um contrassenso num país com rendimentos médios baixos, em comparação com outros países com rendimentos significativamente superiores mas apenas com 40/50% de habitação própria.

Tal política, além do endividamento, contribuiu igualmente para o crescimento exagerado e desordenado das periferias com o licenciamento de urbanizações, muitas delas em locais discutíveis e criticáveis, tais como em linhas de água, encostas ou terrenos inapropriados, para o investimento empolado em infraestruturas e acessibilidades e a sua manutenção por parte do erário público, para a expulsão das famílias das cidades, o aumento do tempo e do custo da deslocação diária, a redução do tempo disponível à família, ao descanso e ao lazer e, embora não seja o único fator, contribuiu também em larga medida para o abandono e a degradação do edificado nas cidades.

Mais recentemente, o significativo crescimento do turismo de curta duração nas cidades veio originar a brusca transferência de casas do mercado de arrendamento para o alojamento local (AL), quer pelo crescimento da procura de alojamento, quer pelo rendimento auferido ser bastante superior ao do arrendamento, quer ainda por ter uma fiscalidade mais favorável, porquanto o IRS incide apenas sobre 15% do rendimento anual auferido e no arrendamento aplica-se uma taxa liberatória de 28% sobre o total anual das rendas auferidas.

Estes fenómenos conjugados contribuíram para o desinteresse no arrendamento, quer por parte da propriedade, quer por parte das famílias, o que também contribuiu para a redução da oferta e o seu encarecimento, donde resulta um mercado de arrendamento habitacional incipiente, desinteressante e com insuficiente credibilidade e, consequentemente, o não cumprimento da sua função económica e social.

Acresce que, entretanto, após uns breves anos de redução de crédito à habitação, os bancos voltaram a proporcionar novo ciclo de crédito, em vez de financiar a economia e as empresas, que veio a constranger e limitar de novo a possível expansão do mercado de arrendamento.

Perante estes e outros desafios, urge criar e desenvolver condições, legais e materiais, para a dinamização do arrendamento urbano, em particular no habitacional, de modo a satisfazer as necessidades da procura e a garantir um rendimento ajustado, estável e prolongado da propriedade.

Para tanto, e mais uma vez, entendeu a AIL elaborar e fundamentar as propostas que a seguir apresenta, pelo que, considerando:

a) Que o arrendamento tem uma função social de inegável e insubstituível relevo.

b) Que o arrendamento é uma prestação de serviços de uns – os senhorios – a outros – os inquilinos – sendo por isso uma atividade económica.

c) Que o arrendamento não é considerado uma atividade económica, idêntica a outras, com as suas regras próprias face à sua natureza.

d) Que a atual legislação do arrendamento (NRAU) em vigor desde novembro de 2012, contrariamente ao propalado quando da sua elaboração e aprovação, não trouxe qualquer contributo sério para a dinamização e a credibilização do mercado de arrendamento.

e) Que apenas pretendeu, comprovadamente, transformar todos os arrendamentos, habitacionais e não habitacionais, a prazo curto, criar instabilidade contratual, facilitar despejos e cobrar mais impostos.

f) Que a oferta de habitação para arrendamento continua a ser claramente insuficiente para satisfazer a procura.

g) Que o crescimento da procura turística retirou ainda mais apartamentos do arrendamento, aumentando a escassez e os preços.

h) Que as rendas pedidas e praticadas são de valor elevado face ao rendimento das famílias, impedindo a satisfação do direito à habitação.

i) Que o arrendamento habitacional não comporta suficiente estabilidade contratual.

j) Que a fiscalidade sobre a propriedade arrendada e sobre o rendimento das rendas é elevado e desadequado à função social do arrendamento.

k) Que se deve procurar soluções tendo em conta os interesses da procura e da propriedade.

l) Que a reabilitação e a regeneração do edificado devem ser uma prioridade.

m) Que os municípios, como entidades da administração pública gestoras do território a nível local, devem ter uma maior e mais qualificada intervenção no que respeita ao arrendamento urbano.

Donde, para regrar e incentivar o arrendamento, a AIL considera apropriado desenvolver medidas:

a) Que definam o arrendamento urbano como uma atividade económica, idêntica a outras, estabelecendo o quadro geral apropriado desta atividade e que transfira competências e responsabilidades para os municípios na definição de regras locais de acordo com as suas especificidades.

b) Que tenham como objetivo regrar, disciplinar e credibilizar o mercado, bem como o modo de intervenção da administração.

c) Que incentivem, administrativa e fiscalmente, o arrendamento por parte da oferta e da procura.

d) Que equacionem a disponibilização de locados para o arrendamento no âmbito das contrapartidas da reabilitação e regeneração do edificado,

e) Que, no âmbito fiscal, tenham o objetivo de aliviar os encargos sobre a propriedade arrendada, pressionando o valor das rendas para montantes compatíveis com o rendimento das famílias e das atividades económicas e sociais.

f) Que ponderem soluções para o aumento da oferta através da contratualização entre o setor público e o setor privado de bolsas de locados destinados ao arrendamento com rendas acessíveis.

g) Que reavivem regimes de renda limitada destinados, em particular, aos mais jovens.

h) Que equacionem um ciclo de investimento público na habitação, destinada a bolsas de arrendamento ou à aquisição através da modalidade de renda resolúvel.

Para o efeito, a AIL propõe:

A – No plano administrativo:

1. Estabelecer um registo municipal, prévio e obrigatório, de todos os locados que se destinem ao arrendamento, habitacional e não habitacional, sem o qual o locado não poderá ser arrendado.

2. Estabelecer, as condições necessárias e suficientes quanto ao estado de conservação do locado para poder ser colocado no mercado de arrendamento habitacional.

3. Exigir, para o arrendamento habitacional, no início do arrendamento, a anexação ao contrato da certificação municipal do estado do locado, verificado e confirmado pelas partes contratantes.

4. Instituir um livro de cadastro do prédio onde obrigatoriamente se registem todas as obras de conservação ou alterações realizadas, tanto nas partes comuns, como nas frações.

5. Tornar obrigatória, para efeitos de registo e estatísticos, a comunicação ao Município dos contratos de arrendamento, bem como de eventuais alterações ou aditamentos.

6. Estabelecer e definir, para o arrendamento habitacional, o conceito de “RENDA ACESSÍVEL“, assente num valor máximo, determinado pelo coeficiente de 1/25 sobre o VPT atualizado do locado e contendo fatores minorativos relativos à vetustez e ao estado de conservação do edifício.

7. Instituir um “SEGURO DE RENDA”, da responsabilidade do senhorio, com prémio acessível atendendo ao baixo risco que comporta e que não contribua para pressionar o valor das rendas, tendo em vista a credibilização e confiança da sociedade e das partes no mercado de arrendamento.

B – No plano fiscal:

1. Reduzir ou mesmo isentar de IMI os fogos quando efetivamente arrendados segundo o conceito de “RENDA ACESSÍVEL”.

2. Criar uma taxa autónoma simbólica para o rendimento anual das rendas dos arrendamentos habitacionais, a incidir sobre o montante da “RENDA ACESSÍVEL” ou, em alternativa, o valor da renda resultante do cálculo de 1/25 aplicado ao Valor Patrimonial.

3. No caso de o valor da renda não cumprir o limite máximo da “RENDA ACESSÍVEL” ou de 1/25 sobre o VPT, deve ser taxado autonomamente com a taxa máxima de IRS e não ter qualquer incentivo ou benefício fiscal, mesmo no caso de a propriedade ser de entidades isentas de impostos.

4. Tratar fiscalmente, de igual modo, o rendimento dos senhorios coletivos, independentemente da sua natureza jurídica.

5. Introduzir para os inquilinos habitacionais, em sede de IRS, a dedução de 15% de todas as rendas, sem exceções, até ao montante máximo de uma vez e meia da RMN em vigor.

6. Rever o Código do IMI no que respeita à forma de cálculo do Valor Patrimonial Tributário – VPT, reduzindo o seu atual excesso, fixando valores substancialmente inferiores ao potencial valor de mercado.

7. Estabilizar a taxa de IMI mantendo a discricionariedade de os municípios decidirem a taxa a aplicar dentro de parâmetros predefinidos.

C – No plano das garantias, em geral:

1. Extinguir o Balcão Nacional de Arrendamento.

2. Constituir Tribunais especializados e/ou atribuir mais competências aos Julgados de Paz para dirimir os conflitos ligados ao arrendamento.

3. Definir, com clareza, a obrigatoriedade da conservação regular do edificado por parte dos proprietários, bem como a intervenção da administração pública em caso de omissão do particular.

4. Garantir o realojamento ao inquilino ou a reocupação do locado, no caso de demolição e ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos ou, em alternativa, definir um quadro indemnizatório no mínimo igual a cinco vezes o montante anual resultante da aplicação de 1/25 do VPT atualizado do locado.

5. Estabelecer um prazo de duração mínima de 3 anos do contrato para efeitos habitacionais, bem como a reposição de arrendamentos de duração transitória, com a indicação expressa dos casos admissíveis.

6. Definir a estrutura de custos para a formação do valor da renda, impedindo a imputação ou acréscimo de custos variáveis e não controlados pelo inquilino, como seja a comparticipação regular para o condomínio, para obras ou reparações da responsabilidade do senhorio, seguros de propriedade, IMI, entre outros.

D – No plano do arrendamento não habitacional:

Atendendo às diversas necessidades e diferentes especificidades, a AIL entende adequado autonomizar, em capítulo ou lei própria, o arrendamento não habitacional, devendo-se:

1. Consignar que as partes considerarão obrigatoriamente a especificidade da atividade económica, cultural ou social, do arrendatário em conformidade com a legislação própria.

2. Consignar que as partes definirão obrigatoriamente as condições de duração, renovação e denúncia do contrato.

3. Consignar a garantia do realojamento do inquilino ou a reocupação do locado, no caso de demolição e ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos ou, em alternativa, definir um quadro indemnizatório no mínimo igual a cinco vezes o montante anual resultante da aplicação de 1/25 do VPT atualizado do locado.

Setembro de 2016

A DIREÇÃO

Romão Lavadinho

Presidente

 

 

http://www.ail.pt/Comunicados/ArrendamentoUrbano.aspx

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